Muito se tem falado e escrito nos últimos tempos sobre a Sharing Economy, economia partilhada, ou, como eu prefiro chamar-lhe, economia do povo. Se bem que tenha começado com uma vertente social de partilha de recursos humanos e materiais, evoluiu rapidamente para uma economia em que coloca o indivíduo como um cidadão ativo e participante na sociedade; são pessoas, organizações, cooperativas ou empresas que assentam o seu modelo de negócio na partilha. Não na partilha com o intuito de ajudar o próximo mas na partilha visando uma lógica de gestão eficiente de recursos.
Mas o que tem isto a ver com Turismo?
Pois bem, este setor, direi melhor, esta indústria, abraça como poucas o que é novo e, na grande maioria das vezes, lidera como poucas no espírito inventivo de encontrar novas soluções. Recuamos dezena e meia de anos, mesmo para os primórdios da Internet – não foi assim há tão pouco tempo – e constatamos que o Turismo foi o primeiro setor a abraçar a Internet como plataforma para fazer negócios. Primeiro a aviação, mais tarde a hotelaria e a seguir as OTA’s mudaram toda a forma como os players se relacionavam entre si e com o consumidor final. Para mim, que comecei desde miúdo a trabalhar em agências de viagens, tem sido uma aventura digna de um qualquer livro de Júlio Verne.
Mas voltemos ao tema da economia partilhada e às suas consequências. Diz-se que se trata de uma inevitabilidade e que tentar parar o movimento é como tentar parar a Internet, que é impossível. De uma forma mais visível tem-se assistido a uma materialização deste conceito no aluguer de apartamentos privados para fins turísticos e, mais recentemente, no caso da Uber, os táxis-que-não-táxis. Sou de uma geração que viveu intensamente o Maio de 68, onde um dos gritos de ordem era “é proibido proibir”. Isto, por si só, não faz de mim um liberal selvagem. A vida ensinou-me que, apesar de ser proibido proibir, é necessário regulamentar. Os apartamentos turísticos, desde que devidamente enquadrados por uma lei, respeitando regras de segurança e pagando os seus impostos devem continuar a funcionar. Trata-se de uma fonte adicional de receitas para muitas famílias e um investimento de muitas pessoas que ali depositaram todas as suas esperanças de uma vida digna. Aliás, com os juros tão baixos e uma rentabilidade nas poupanças tão diminuta, muitos portugueses encontraram no imobiliário um bom investimento. O problema é que este modelo de sharing economy levanta-me outras questões. Por exemplo, se eu vivesse no apartamento debaixo, será que gostaria de ter constantemente barulho e de ver pessoas estranhas a entrar todos os dias no meu prédio? Depois, será que este modelo não estará a levar a uma nova forma de desertificação dos bairros históricos e à sua consequente descaraterização? Sabendo que os turistas procuram casas para alugar principalmente nos bairros históricos de Lisboa e Porto, temos assistido a uma corrida à compra de casas nesses locais para uso turístico intensivo. Curiosamente, discordo desta ideia de desertificação. Desertos estavam já os bairros históricos, com edifícios decrépitos e abandonados criando cenários verdadeiramente assustadores. Talvez não seja o modelo ideal de trazer gente para dentro da cidade, mas num País que (ainda) atravessa uma crise económica é a recuperação possível. Temos é de estar gratos ao Turismo por ter reabilitado tantos imóveis nas zonas históricas e ter trazido vida.
E isto leva-me a outra questão tão em voga neste último verão, a do excesso de turistas. Começo desde já por afirmar que Portugal não tem excesso de turistas. Poderá ter excesso de gente invejosa, de gente que não estuda, de gente que não se prepara, mas não terá certamente excesso de turistas. Barcelona sofreu desse mesmo problema até que implementou um sistema de monitorização e alerta para o número de autocarros em determinadas zonas da cidade, levando a uma distribuição mais equitativa de turistas pela cidade. Se Lisboa e Porto querem continuar a somar turistas é necessário criar novas centralidades. Alguns dirão que há falta de planeamento mas isso é como a eterna discussão do ovo e da galinha. No caso, primeiro surgem os turistas, que geram receitas suficientes para que haja o tão necessário planeamento e infraestruturas.
Finalmente vimos a chegada da Uber e da consequente contestação por parte dos taxistas. O princípio de ser transportado em carros novos, por gente bem-educada, que fala várias línguas, que me permite escolher a música e a temperatura no carro e ainda me cobra metade que um táxi, só pode ser aplaudida. Por outro lado, todos sabemos o preço elevado das licenças de um táxi e os impostos a que estão sujeitos. Na mesma lógica do alojamento turístico, se a Uber pagar impostos em Portugal e estiver devidamente enquadrada legalmente não vejo por que razão não possa funcionar. No fundo, os táxis representam muitos modelos de negócio que não souberam evoluir quando todo o mundo à sua volta mudava.