“Hoteleiros vs Hosteleiros?” foi o tema debatido esta quarta-feira, 12 de junho, no almoço mensal da AHP – Associação da Hotelaria de Portugal, no Hotel Real Palácio, em Lisboa e que contou com Bernardo D’Eça Leal, do The Independent Hostel & Suites e Miguel Simões de Almeida, do Alma Lusa Baixa-Chiado, como convidados.
O debate, moderado por Cristina Siza Vieira, presidente da direção executiva da AHP, deixou no ar questões como porque é que os interlocutores, proprietários destes alojamentos locais, seguiram estes caminhos, que vantagens e desvantagens encontraram, o que dizem do estado atual da oferta de alojamento em Portugal e que futuro anteveem para os seus negócios e para a hotelaria convencional?
Cristina Siza Vieira começou por revelar que a 6 de julho de 2017 estavam registados em Portugal 44.427 unidades de alojamento local, dos quais 441 hostels, um total de camas contabilizadas pela Associação de Hotelaria de Portugal, de uma forma muito simples, cada unidade de alojamento multiplicado por cinco camas e um hostel por 50 camas, chegamos à conclusão que em Portugal existem 241.980 camas em alojamento local, das quais 22.050 em hostels.
No Registo Nacional dos Empreendimentos Turísticos (RNET), na mesma data, tínhamos 1.238 hotéis, com 204.475 camas registadas. Isto significa dizer que neste momento em Portugal temos 54% de camas em alojamento local e 46% de camas em hotéis.
Fazendo um resumo a alguns concelhos e distritos. No concelho de Lisboa, o Registo Nacional de Alojamento Local temos 8.752 registos de alojamento local, dos quais 131 hostels, o que significa 49.655 camas de alojamento local. Enquanto que no RNET temos 192 hotéis, 36.511 camas. Conclusão: 58% das camas em Lisboa concelho são de alojamento local versus 42% de camas em hotéis.
“Para terem uma ideia, o concelho de Lisboa no todo nacional, em termos de alojamento local representa 20% da oferta, o distrito (os 16 concelhos) representa 26%. Portanto é relevante o grosso da oferta de alojamento local está no concelho de Lisboa”, sublinhou Cristina Siza Vieira.
No Porto, o registo nacional de alojamento local tem 3.650 registos, portanto 19.600 camas, apenas 30 hostels também. Temos 79 hotéis, significa mais uma vez que entre as 19.600 camas do alojamento local versus 12 mil camas em hotéis, temos 62% de camas em alojamento local versus 38% de camas em hotéis.
“A percentagem do concelho do Porto é de 8% no todo nacional, do distrito (dos 18 concelhos do Porto) são 10%. Realmente aqui as cidades é que pontuam”, frisou a presidente da direção executiva da AHP.
No Algarve, distrito de Faro (16 concelhos) a oferta é muitíssimo substancial, 20.239 registos com 105 mil camas, das quais 3.900 em hostels. No RNET estão registados 135 hotéis, 41.608 camas o que significa que no Algarve, distrito de Faro temos 72% de camas em alojamento local versus 28% de camas em hotéis. O alojamento local no Distrito de Faro equivale a 46% do total da oferta nacional.
Cristina Siza Vieira aproveitou ainda para parafrasear Raul Martins, Presidente da AHP, ao dizer que, “Não podemos transformar todo um bairro num hotel ou num alojamento local”, colocando a primeira questão aos dois convidados: O que os levou a optar pelo alojamento local?”
Celeridade no processo e pensar nos clientes
Miguel Simões Almeida apontou como tomada de decisão de optar por um alojamento local, a celeridade no processo: “No fundo continuei a fazer aquilo que sabia e de que gosto. Inicialmente pensei em abrir um boutique hotel, mas perante o chamado ‘time to market’ tão importante para quem investe, decidi optar por um trajeto que permitisse que o empreendimento fosse licenciado o mais depressa possível, para começar a ser rentabilizado. Estamos a falar de 2013, altura em que dei início ao processo. Então, aproveitando um decreto-lei de 2008 de alojamento local, que permitia algumas diferenças em relação ao licenciamento clássico, como por exemplo centralizar o processo todo numa só entidade, neste caso a Câmara Municipal de Lisboa, ultrapassando assim o Turismo de Portugal, e também sendo uma reabilitação no centro histórico em tivemos algumas dispensas de requisitos, fez com que optasse por esta solução e de facto foi a forma mais rápida que encontrámos para pôr o investimento a funcionar.”
Já Bernardo D’Eça Leal, que apesar de o seu background não estar ligado à atividade hoteleira, – embora tivesse passado por estágio num hotel – e as pessoas que o acompanham no projeto do The Independent Hostel & Suites, o primeiro pensamento foi para os clientes e para aquilo que a unidade lhes poderia trazer em termos de proximidade. “Abrimos as camaratas e um restaurante que estivesse aberto à cidade, neste caso aos lisboetas, porque não há nada mais simpático do que um hóspede encontrar locais nos sítios onde se aloja”.
“Penso que finalmente a criação de guest houses e de alojamentos locais estão a tornar-se muito importantes para as cidades e a mudar a mentalidade dos hoteleiros, fazendo-os pensar naquilo que os clientes realmente querem encontrar numa unidade hoteleira”, sublinhou Bernardo D’Eça Leal.
Vantagens e desvantagens do alojamento local
Em termos de vantagens e desvantagens também os dois convidados teceram as suas opiniões, com Bernardo D’Eça Leal a relembrar que a “umbrela” Alojamento Local atribuída às diferentes unidades, deveria ser alterada.
“O lado da distribuição é fundamental como sabemos todos, também estamos nos mesmos motores e montras que hoteleiros e aí na filtragem, quando um cliente vai filtrar num Booking.com, numa Expedia, seja o que for, se quiser um hotel e não souber o que é que é um alojamento local – o próprio nome da categoria é mau, não diz nada aos portugueses e muito menos aos estrangeiros – vai alterar a busca para hotel e eu desapareço da pesquisa. Com certeza que com o Miguel também se passa o mesmo. O lado do financiamento também é um contra, pelo menos enquanto tínhamos os Qren não conseguíamos as linhas enquanto alojamento local. E a questão das associações hoteleiras e esta é uma das razões porque nos juntámos à AHP, porque as associações que existem de hostels não têm força para tratar de questões camarárias, como obras, lixo ou trânsito”, enumera o mesmo empresário.
Já Miguel Simões de Almeida mencionou uma vantagem, que é o facto de no alojamento local ser possível obter a licença final através da Internet. “Para mim a ideia base foi tentar fazer uma coisa licenciada da forma mais fácil, mas respeitando ao máximo o que é o meu cliente, que procura um boutique hotel. Eu lembro-me que neste decreto-lei de 2008, uma unidade com menos de 50 pessoas não precisava de extintor, mas para mim não fazia sentido sem ter um sistema de incêndio e de segurança. Portanto havia muitas vantagens que eu também não cumpri, porque não faz parte da minha forma de estar na hotelaria.”
Novo aeroporto tem de ser uma realidade
Neste debate e perante a questão sobre o estado atual da oferta de alojamento em Portugal e que futuro anteveem para os seus negócios, Bernardo D’Eça Leal e Miguel Simões de Almeida concordaram que urge fazer um novo aeroporto em Lisboa, uma vez que o atual está no seu limite e é a principal porta de entrada do país.
Apesar da conjuntura económica favorável o dono do Alma Lusa Baixa-Chiado sublinha que “esta é uma altura má para fazer negócios, porque os preços das casas estão muito acima do que estavam há dois anos, e, portanto, se acontecerem oportunidades em que o racional faça sentido, ótimo”.
Bernardo D’Eça Leal relembrou ainda que está a assistir-se a uma “bolha” de estrangeiros que querem viver em Lisboa e investir em Portugal, e que “devíamos conseguir espalhar este fluxo turístico por outras zonas do país e até da capital portuguesa”.