Desidério Silva, presidente da Região de Turismo do Algarve

“O Algarve só pelo verão não consegue ter sustentabilidade para viver durante todo o ano”

Viajar – O turismo do Algarve celebra este ano o seu 45º aniversário. Como vê a história desta identidade e o que acha fundamental manter ou mudar no futuro?
Desidério Silva – Estes 45 anos permitiram um processo em que o turismo do Algarve se foi consolidando. Foi a partir do ano de 1970 que a região começou a dar sinais mais evidentes do que poderia vir a tornar-se em termos de turismo. A história da região passa também muito por aquilo que foi a construção do Aeroporto de Faro, que este ano comemora os seus 50 anos, daquilo que foram as acessibilidades e, por último, por aquilo que a região conseguiu mostrar ao longo dos anos em termos de qualidade de um território, que apesar de ter poucas infraestruturas, foi-se adaptando ao longo dos anos para conseguir chegar ao que é hoje. Em 45 anos conseguiu atingir um patamar de referência no turismo internacional, que acabou por vir dar mais responsabilidades aos agentes, públicos e privados.
2007 foi apontado como o melhor ano de sempre para o turismo do Algarve e a partir daí, e até ao ano passado, foi sempre a descer devido à crise. 2014 foi o ano de retoma e começamos a pensar novamente que tem que existir uma sustentabilidade em função daquilo que é o investimento e a receita. Este é um processo evolutivo e pensamos que dentro de dois a quatro anos iremos conseguir lá chegar.
O Algarve de futuro terá que reorganizar alguns dos seus produtos. É uma região que tem equipamentos de qualidade, embora haja alguns já estejam a necessitar de alguma requalificação. São desafios que nos estão a ser colocados, até porque temos igualmente que encontrar novos produtos em função da procura.

Estes novos produtos são sobretudo para a época de inverno na tentativa de combater a sazonalidade?
Sim, principalmente para essa época. Temos um plano de marketing estratégico para a região que tem como principal prioridade a criação de condições para que os meses de março e abril comecem a ter uma taxa de ocupação muito maior para fazer face à oferta existente. Não é sustentável uma região que tendo mais de quatro milhões de dormidas em agosto tenha apenas 350 mil em janeiro. Temos que olhar para todas as características da região e, a partir daí, tirar partido de todas elas para diminuir a sazonalidade.

E estes atrativos passam por que áreas e produtos?
O turismo de natureza e o desportivo são duas áreas fundamentais para podermos ter um turismo atrativo de inverno.
A Região de Turismo do Algarve (RTA), juntamente com a Associação de Turismo do Algarve (ATA) e as autarquias da região, estão a trabalhar para desenvolverem estes produtos promissores.
Temos apostado bastante em trazer agentes de viagens e jornalistas estrangeiros à região para potenciarmos principalmente os produtos alternativos ao sol e mar. Estamos a trabalhar afincadamente e pensamos que a sazonalidade no Algarve tenderá a diminuir cada vez mais. O Algarve só pelo verão não consegue ter sustentabilidade para viver durante todo o ano.

A vossa aposta está a recair mais no mercado português ou nos principais mercados emissores de turismo para Portugal e, mais particularmente, para o Algarve?
Temos vindo a trabalhar em todas as vertentes. A RTA a nível da Península Ibérica e a ATA nos restantes mercados emissores.

Tendo em conta as medidas que o Governo da Coligação PSD-CDS/PP tomou nos últimos quatro anos em relação à região, pensa que o que foi feito foi suficiente?
Tanto eu como o meu antecessor, dado que estou na presidência da RTA há apenas três anos e meio, sempre tentámos trazer assuntos e preocupações ao Governo, através do secretário de Estado do turismo, do ministro da Economia e do Turismo de Portugal. São preocupações que têm a ver com intervenções de fundo, nomeadamente das acessibilidades. É o caso da requalificação da N125, da linha férrea de Tunes para Lagos e da sua eletrificação, da forma e modelo de pagamento das portagens da Via do Infante, da necessidade de intervenções em alguns porto e marinas, entre outras.
O Algarve tem exposição mediática e é uma região fantástica que tem ganho prémios em várias categorias. Se houvesse uma intervenção na região no sentido de melhorar algumas falhas, tenho a certeza que a região e o turismo ficariam a ganhar ainda mais. Agora com o novo Governo, seja ele qual for, vamos continuar a exigir que estas medidas sejam postas em prática.

Vilamoura prepara-se para receber o maior projeto turístico português. Acha que este projeto irá impulsionar ainda mais o turismo de luxo do Algarve?
Vilamoura já é claramente o maior projeto turístico de Portugal. Estes são investimentos de topo que não vêm revitalizar apenas Vilamoura. Vêm demonstrar que a região está consolidada, preparada para receber o investimento e segura para quem quer investir, principalmente, por parte dos chineses e franceses que já têm vindo a demonstrar essa vontade no turismo de luxo.

O golfe também sempre foi um grande atrativo para o turismo médio/alto do Algarve, destino que já foi considerado, por diversos anos, o melhor do mundo para o golfe. Considera que este fator também tem contribuído bastante para atrair investidores?
Sem dúvida alguma. O golfe tem-nos ajudado bastante a atrair os melhores mercados emissores. Este setor tem sido muito bem trabalhado nas ações de promoção que são feitas nesses países. Depois um destino que é considerado um dos melhores do mundo numa determinada matéria é porque é atrativo.
O Algarve tem 40 campos de golfe e a maioria foi desenhada e projetada pelos melhores arquitetos da área do mundo.
Embora o Algarve seja indubitavelmente um destino de sol e mar, temos que ir promovendo e melhorando todos os outros produtos para os apresentarmos como alternativos, porque só assim o Algarve pode vir a consolidar-se como um destino sustentável.

Quantas dormidas são esperadas este ano para o Algarve?
Até dezembro estão previstas mais de 17 milhões de dormidas, o que é bastante positivo. Convém mencionar que o Algarve contribui com 4,5 mil milhões de euros para o PIB na área do turismo, que é de 11 mil milhões no seu todo só neste setor.
2015 é um ano ganho para o Algarve e a recuperação da crise está a começar a ser visível. É preciso é que todos façam o seu trabalho bem feito e sempre em conjunto.

A hotelaria no Algarve ainda tem capacidade para crescer?
A hotelaria do Algarve tem espaço para crescer, mas tem que o fazer através de uma oferta inovadora, totalmente diferente da que existe atualmente. Mais do mesmo não faz sentido. As unidades existentes têm, cada vez mais, necessidade de serem requalificadas e reajustadas à realidade e à procura. Mais requintadas, dotadas de higiene e limpeza acima da média, e pessoal formado e qualificado. Têm que estar preparadas para receber pessoas com deficiências físicas, porque estas existem e viajam cada vez mais. Se não estivermos preparados para as receber, estas irão optar por outros destinos, o que não será nada positivo para a diversidade de oferta do Algarve. A sensibilidade dos hoteleiros para estas questões já está a mudar.

Os hotéis no Algarve estão a optar por fechar cada vez menos tempo durante a época baixa e, há mesmo, quem já esteja aberto o ano inteiro. Ao que se deve esta mudança de estratégia na hotelaria algarvia?
Isto deve-se a uma maior procura para essa época. A razão passa pelos efeitos da campanha de marketing que temos vindo a desenvolver nos principais mercados emissores, pelas boas ofertas que os hotéis têm vindo a dar e pelos produtos alternativos que dispomos, como o turismo de natureza e a observação de aves. Congressos, incentivos e apresentações de marcas têm sido outro dos motivos.
No ano passado tentámos conversar com as grandes cadeias hoteleiras para que estas não fechassem as unidades na totalidade durante o inverno ou que o fizessem apenas parcialmente. Conseguimos que algumas aceitassem e as coisas correram bem.
Temos vindo a trabalhar também em conjunto com o aeroporto e a oferecer incentivos aos operadores para que vendam o destino. Tudo isto tem ajudado.
Se continuarmos a trabalhar desta forma, dentro de uns quatro anos poderemos já ter minimizado fortemente a sazonalidade no Algarve.

O Algarve sempre teve grandes problemas e uma enorme massificação no que respeita ao alojamento ilegal. As medidas que o anterior executivo tomou nessa matéria, com o Alojamento Local, serão suficientes?
Já há muitos proprietários de apartamentos e casas a introduzirem o pedido de Alojamento Local, tendo reduzido significativamente o diferencial que existia quando comparando com há uns cinco anos atrás. Acredito que cada vez mais essas ações individualizadas irão sendo apanhadas pela fiscalidade e que dentro de mais uns cinco anos já será muito difícil esse negócio ilegal ter continuidade.

Concorda com a não obrigatoriedade de estrelas na hotelaria?
Não, não concordo. A qualidade não deve estar apenas nos quatro e cinco estrelas, tem que estar presente em todas as unidades.
Destaques:

2015 é um ano ganho para o Algarve [mais de 17 milhões de dormidas] e a recuperação da crise está a começar a ser visível. É preciso é que todos façam o seu trabalho bem feito e sempre em conjunto.

O golfe tem-nos ajudado bastante a atrair os melhores mercados emissores.

A hotelaria do Algarve tem espaço para crescer, mas tem que o fazer através de uma oferta inovadora, totalmente diferente da que existe atualmente.

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