O velho-novo «segredo público»: a importância do turismo interno

Nas ideias pré-concebidas sobre turismo, sobretudo na era do grande crescimento que se verificou até 2019, seria paradoxal falar na importância da proximidade. Em diversas circunstâncias, o sucesso do turismo foi afirmado e reafirmado através da bandeira das chegadas internacionais. Em boa verdade, esse é mesmo um importante indicador da vitalidade do setor. Contudo, não é o único, embora tenha feito todo o mercado, durante largos anos, esquecer a relevância do turismo interno e dos mercados de proximidade.

Neste momento de início de retoma, onde ainda se navega na incerteza e se perspetivam crescimentos diferentes do passado, estamos a recuperar a consciência da importância deste tipo de mercado. Encaramos, até com algum entusiasmo, a possibilidade de desenvolver produto, iniciativas promocionais e planeamento estratégico para fomentar e consolidar fluxos turísticos dentro do País ou mesmo dentro das nossas regiões. Esta é apenas a constatação de um facto que se encontra plasmado, por exemplo, no «Plano de Ação Recuperar o Turismo | Construir o Futuro», da iniciativa do Governo de Portugal.

Nos Açores, o mercado nacional sempre foi vital. Mais de metade da procura turística na Região provém, tradicionalmente, de Portugal Continental, embora, nos últimos anos essa proporção se tenha esbatido ligeiramente. Em 2020, um ano verdadeiramente atípico e durante o qual a atividade turística foi praticamente inexistente, o mercado nacional destacou-se e representou mais de três quartos da procura. Aliás, perante os inúmeros desafios resultantes da pandemia de Covid-19, percebeu-se que os mercados de proximidade teriam uma importância acrescida, que estaria relacionada com o receio de viajar (principalmente para destinos distantes) e com a minimização do risco das viagens (estar, por exemplo, integrado no mesmo Sistema de Saúde cria um conforto adicional perante a ameaça da pandemia). Porém, surgia, também, a oportunidade de conhecer e descobrir destinos nacionais alternativos, pelos quais há o desejo secreto e a curiosidade inata, mas que, em circunstâncias normais, vão ficando inexplicavelmente adiados.

Por tudo isto, a estratégia dos Açores para 2021 reforçou a preocupação com o mercado nacional e com o mercado interno da Região. Em abril, foi lançada a campanha «Açores, Seguro por Natureza», entre outras iniciativas, com um foco muito particular no mercado nacional. Adicionalmente, em junho, entrou em vigor uma das mais emblemáticas medidas do atual Governo Regional, a «Tarifa Açores». Esta tarifa permite que os residentes na Região possam viajar entre ilhas por um máximo de 60 € round trip, um valor historicamente baixo e que criou a oportunidade para todos os açorianos “descobrirem” os Açores. É um instrumento de coesão territorial e social, visando ainda a dinamização do mercado turístico interno.

Em boa hora aconteceu esta aposta estratégica, pois a recuperação da atividade turística tem sido notável. O número de dormidas no conjunto de todas as tipologias de alojamento turístico em agosto de 2021, pico da época alta, já representou cerca de 74% do valor registado em 2019 e, no agregado de janeiro a agosto, já representou cerca de 51%. Se olharmos apenas à hotelaria tradicional constatamos que 72,8% dos hóspedes são nacionais, representando 69,6% das dormidas nestes primeiros oito meses do ano. Ainda que de forma informal, há vários sinais de grande satisfação com a experiência nos Açores, colocando a Região como um destino de excelência para recomendação e repetição.

Reconhecendo que ainda subsistirá muita incerteza para 2022 e até alguma para 2023, perspetiva-se que a importância do mercado interno e de proximidade crescerá nos Açores a curto e médio prazo. É uma nova oportunidade para agentes de viagem e operadores turísticos, para empresas locais e vários outros stakeholders, incluindo as próprias comunidades de cada ilha. Aliás, por aquilo que se percebe também do interior do País, esta poderá ser mesmo uma tendência de grande relevância para a recuperação do setor e traduzir-se em alterações estruturais do mercado.

Mário Mota Borges

Secretário Regional dos Transportes, Turismo e Energia dos Açores

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